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terça-feira, 16 de outubro de 2012

Foundie, estórias, recordações...




Ok, eu admito: tenho muitas dúvidas. Não sou um ser dotado da sabedoria universal, do conhecimento dos grandes gênios. Meu mundinho é pequeno, limitado, fechado, fiel as coisas que acredito. Vou tentar exemplificar.

Tenho dúvidas quando o garçom pergunta: “foundie no óleo ou na pedra?”...Bah, o cara quer me matar. Como é que eu vou saber! Meu paladar diria: o foundie no óleo. Os pequenos pedaços de carne boiando naquela panelinha, a ponta dos garfos aparecendo, contendo na sua extremidade o delicioso cubo de carne, as bolhas geradas pela alta temperatura, a fumaça do azeite se espalhando pelo ambiente - sim, saímos cheirando a cozinha do restaurante, não é bem o aroma ideal para um primeiro jantar romântico. Por outro lado, minha artéria coronária diria: Daniel, tu tá completamente louco? Quer te matar? Sim, como médico eu deveria saber que foundie na pedra é mais saudável, que o óleo irá acumular dentro do “lúmen” dos meus vasos e blá, blá, blá. Nem sempre as escolhas são tão simples. O pior é que devo fazer a escolha no meio de uma conversa. Nossa, daí sim o caos se instala. Meu foco atencional não está na escolha da janta. Meu foco atencional está num par de olhos, num perfume que supera o “delicioso” cheiro de óleo que contamina o ambiente. Nessas horas, fazer um escolha, tomar uma decisão, mesmo que simples, pode se tornar uma tarefa gigantesca.

Além dessa dúvida, tenho outras com as palavras. A diferença entre história e estória. Lembro de infernizar meu pai quando comecei a ter “história” no colégio. Pobre Jorge (meu falecido pai! está no céu por me aguentar, não tenho dúvida alguma!): pai, por que existe história com agá e estória com “e”? E ele, pacientemente, dizia: meu filho, entende de um vez por todas, história aconteceu e estória não. Confesso que, em alguns momentos, discordo dessa teoria. Existem algumas estórias que são reais, que ficam no imaginário por tempos. Eu sei, parece um chavão. Existem estórias significativas. Eu lembro de coisas que talvez nem tenham acontecido, porque guardamos a estória de uma forma e lembramos de outra. E, na próxima vez que lembrarmos, distorceremos ela novamente. Mas é essa nova estória que pode tornar um momento inesquecível ou trágico. Se o cheiro real fosse mais significativo que o momento a estória seria fria, sem alma, sem sentimento. Só que a lembrança forte que cria a estória é tomada pela emoção. A partir daí detalhes viram peça chave de um quebra-cabeça. E a cada nova recordação a estória renasce mais forte, mais avassaladora, com detalhes e requintes de um filme em alta definição. São esses detalhes que fazem as lembranças voltarem na nossa memória. 

Essas minhas dúvidas são histórias ou estórias? Não sei bem. Eu preferia que fossem histórias. Mas como elas renascem novas, com cada vez mais detalhes, acho que são estórias. Mas seria bom a estória ser contada novamente.

Ps: ao som de Matchbox 20...disease...

sábado, 4 de agosto de 2012

As viagens do ancião e o olhar que fala...






O ancião (ok, desde que percebi os primeiros fios de barba branca me senti meio Moisés, uma coisa catártica mesmo! Por isso meu pseudônimo virou o ancião) tem trabalhado muito nos últimos anos. O legal é que na estrada do meu "trabalho" conheci muita gente legal. Aprendi muitos caminhos por essas estradas que percorro semanalmente. Devo ter mais horas de BR101 do que vários de vocês tem de vida. Exagero? Façam as contas! Só de RS foram (antes da reforma, das sinalizações, do túnel, das placas de cuidado com os animais silvestres que podem cruzar no teu caminho...etc) no mínimo duas horas. Em SC mais 3h. Logo, temos 5 horas. Ida e volta, somadas, 10 horas. Mutiplicando-se esse número pelo número de finais de semana do ano...vezes o número de anos...nah...hora de parar. 

Taí um outro lance legal. Hora com aga é tempo...ora sem aga é sem tempo...putz...estranho isso. Uma letrinha na frente das outras faz tanta diferença. A maioria dos SMSs que recebo me perguntam qual é a hora. Legal, eu respondo. Esse é o tempo físico, real, concreto...será? Eu nunca vi um minuto andando solto por aí. Acredito que o tempo é uma unidade de medida de algo que não gostamos nem queremos medir. Se é uma situção ruim queremos que passe rápido. Se é uma situação boa não queremos que termine. Triste esse lance do tempo. Na real ele nunca preenche todos os "tempos" que nós queremos e precisamos.

A outra ora é um pouco mais complexa. Dessa vez, não são mensagens, mas é "uma" mensagem, um único SMS. Algo do tipo: ora, ora, ora... Bah, esse tempo que o "ora, ora, ora..." quer dizer é muito concreto. Andar no fio da navalha não é uma das sensações mais interessantes do mundo. Saltar do avião sem o para-quedas reserva é "meio arriscado". Essa unidade de medida da "ora" é muito mais assustadora. Confesso que a reação tem que ser bem pensada. Qualquer resposta que seja vaga pode aumentar o tamanho da "ora". 

Algumas vezes, o sorriso resume o tempo e o tipo da hora/ora usada. Um par de olhos são devastadores para o tempo. A temida "encarada", que nada mais é do que uma "simples" troca de olhares, diz muito. Quando o olhar é triste, quando o olhar é tensionado por um momento decisivo, quando o olhar é de descoberta, quando o olhar é de despedida, quando o olhar é de saudade. Uma das minhas bandas favoritas, o falecido Oasis, diz mais ou menos assim: 


Slip inside the eye of your mind 
Don't you know you might find
A better place to play

Pois é, seria mais ou menos o seguinte a tradução literal: 

Deslize para dentro do olho de sua mente 
Você não sabia que poderia encontrar 
Um lugar melhor para brincar?

Como o título da música diz, don't look back in anger, não olhe pra trás com raiva. Sério, o cara tá pedindo o seguinte - parece simples o pedido lúdico e lúcido dos irmãos Gallagher, eu disse parece! - não me olha com aquele olhar que EU conheço e, muito menos, não usa o TEU olhar com raiva comigo. O olhar mostra a parte de dentro da alma. Os sentimentos mais secretos estão trancados a sete chaves atrás do olhar. 

Além de indicar o caminho pra entrar mente adentro o olhar mostra os caminhos pra "brincar". E também o melhor lugar pra tudo isso. A imagem da garrafa de vinho, o sofá da sala, o centro da casa que foi invadida pelo olhar. O olhar que o meu olhar viu no teu olhar...

Ora/hora dessas descubro um motivo pra tudo isso...um dia...ora, ora, ora...


Ps: ao som de Oasis, na Latitude 33, o paradoxo do olhar perdido/perfeito...

segunda-feira, 30 de julho de 2012

O urso polar, o beijo e o não esquecimento...


Nunca pensei muito no que realmente me motiva a escrever. Acredito que as situações sejam as mais diversas possíveis. Uma imagem na internet, uma notícia no jornal, uma música no rádio do carro. Bah, acho que a imensa maioria das minhas ideias absurdas surgem dentro do carro. Minha falecida vó Célia já dizia: "cabeça vazia é a oficina do diabo Daniel". Eu confesso que o pequeno Daniel não entendeu muito bem a mensagem. Quando criança o mundo é muito concreto. Fiquei um longo período divagando sobre a existência do diabo dentro da minha cabeça. Não era bem essa a intenção da mensagem. Passados alguns anos, talvez décadas, o ancião Daniel consegue capturar e ,talvez, compreender essa mensagem. O que minha vó quis dizer é que precisamos do ócio para pensar. 

Em pleno período de férias eu fiquei alguns dias no ócio improdutivo. O consultório fica com diversos horários vagos. Aí é que mora o perigo. Justamente, nesses intervalos, a cabeça se coloca a pensar e, na maioria das vezes, são pensamentos abstratos. Digo abstratos porque eles levam a reflexão. Nesses momentos de solidão é preciso parar e pensar, pensar e pensar. O grande barato do pensamento é que ele não tem limite. Por mais chavão que pareça esse é o momento de dar asas a imaginação. 

Nah, não é sempre a imaginação que se faz presente. Existem alguns pensamentos que saem do plano imaginário e migram para a "concretude" do mundo real. O imaginário parece assustador. Eu disse parece. Comparo essa situação ao pensamento obsessivo em determinadas situações. Um jantar inesperado, um beijo surpreendente, uma mensagem que resolva tudo, uma surpresa que pode ou não acontecer. 

Depois que um encontro acontece tudo muda. Não existe mais o que já foi. Existe o que mudou. Uma nova ordem dos fatos. Sim, a ordem dos fatores, nesse caso, modifica o produto final. Ganhei um livrinho com frases de W. Shakespeare e uma chamou a minha atenção, dizia assim: "O amor não se vê com os olhos mas com o coração..." Pois é, acho que é isso mesmo. Existe uma lógica que diz para não "entrarmos" em determinados lugares, pois eles são assustadores. Mas é aí que o pensamento, dominado pelo maldito/diabo resolve trabalhar dentro da sua oficina. Nesse caso, comumente chamado de pensamento. E, pra piorar tudo, o MEU pensamento. 

Se a memória depende da emoção pra funcionar melhor, nada mais ideal que esse tipo de situação. Um jantar, uma conversa, aquele momento único, que começou no sonho e mudou de lugar. Quando as coisas "rolam", quando as coisas dão "liga" fica praticamente impossível não pensar. Sou fascinado pelo momento. As situações únicas são inesquecíveis, duradouras, ficam entranhadas na memória. Óbvio que seria melhor se elas se repetissem mas nem sempre é assim. 

Um exemplo, vamos lá. Um psiquiatra americano tem todo o seu trabalho centrado em uma única frase: "NÃO PENSE NUM URSO POLAR!"...no que você pensou? Eu sei, tente esquecer e eu digo: "NÃO PENSE NUM URSO POLAR!". A sua cabeça está dominada pela imagem do MALDITO URSO! Pode ser o do AnimalPlanet, pode ser o urso de pelúcia do teu quarto, pode ser o Urso da Coca-cola, mas ele está aí, dentro da TUA oficina. 

Em um dia frio, a imagem do meu urso polar é contínua, persistente, obsessiva. Maldito urso polar...