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quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

O gosto do bolinho de batata...


"Somos o que somos por causa daquilo que aprendemos e lembramos", Eric Kandel, prêmio nobel de Medicina em 2000. 





O gosto do bolinho de batata que a minha vó fazia é inesquecível. Mais do que o gosto, lembro dela cozinhando a batata, descascando a batata, amassando a batata. Logo em seguida, ela começa a acrescentar os outros ingredientes. Leite, ovos, sal e outras coisas que eu não lembro muito bem. Tudo era cuidadosamente misturado. Um a um os ingredientes eram misturados e davam consistência àquela mistura. Meio massa, talvez? Nunca encontrei a palavra certa para definir essa mistura.  Ela deixava a "massa" descansar um pouco. Descansar é deixá-la quieta, com um pano cobrindo durante algumas horas. Nesse intervalo, ela dava início ao preparo do guisado. Não era o guisado de máquina, esse vendido no supermercado. Minha vó cortava com as mão. Dizia que a máquina tirava o gosto da carne. Sei que é uma teoria ilógica, mas que fica muito mais saboroso cortado com as mãos, eu garanto que fica. A cada corte da faca pequenos pedaços de carne surgiam. Todos jogados na panela para o cozimento. Junto ia a cebola, o tomate, os temperos mais diversos possíveis. Com o calor na panela, um aroma inesquecível se espalhava pela casa. Terminado o guisado e o descanso da massa, era hora do trabalho mais difícil. Fazer pequenos bolinhos com aquele guisado dentro. Tudo feito com as mãos cuidadosas dela. Passo a passo, sem nenhum pressa. Um erro e tchau bolinho! Depois, eles eram mergulhados na frigideira para a fritura final. Um novo cheiro surgia e tomava conta da casa. Até chegar à mesa e serem devorados numa fração de segundo. Crocantes por fora, macios por dentro. A mistura daquela "massa" de batata com o guisado...meu Deus! Seria algo como uma batata frita gigante recheada com guisado. Imagine isso...eu garanto, é melhor ainda!

Pare e pense um pouco, quais lembranças são inesquecíveis para você? Esse episódio aconteceu quando eu tinha por volta de 6 anos de idade. Lá se vão quase 30 anos. E eu consigo me lembrar de cada passo. Todos eles na ordem. E nunca sairão da minha memória. Ou seja, alguma coisa dentro do meu cérebro se modificou. Caminhos foram criados. Eles são capazes de resgatar essa informação facilmente. Não tenho dificuldade alguma. Aliás, vejo a imagem nitidamente. Recordo de detalhes como o local, a cor da casa, móveis e tudo que cercava o ambiente. São lembranças prazerosas da infância. 

Por que não usamos isso na hora de estudar? Por diversos motivos. Alguns conhecidos: grande volume de informações, desmotivação, medo de frustrar-se tentando entender uma matéria que já rotulamos como impossível de ser compreendida e por aí vai.

Como um estudante vai entender funções em matemática se ele já tem um pré-conceito de que não será capaz de aprender aquela matéria? Antes de iniciar, ele já diz: NUNCA vou entender isso! A lembrança que surgirá será desagradável, indigesta. Nosso cérebro não gosta desse tipo de experiência. Gosta de coisas prazerosas. Você não precisa se transformar num grande gênio para se dar bem em matemática ou qualquer outra matéria que seja desagradável. A missão é transformá-la em algo palatável Algo fácil de ser digerido. Como a minha lembrança do bolinho. Ou como qualquer lembrança que você tenha tido. Pare e pense muito antes de começar algo que não goste, mas que é necessário aprender. Descobrir um jeito de aprender a apreender. Frase batida mas que será útil na construção do conhecimento. Ser persistente é o primeiro movimento nessa empreitada. Talvez você lembre disso...


terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Fala aí Vítor!

Vítor Rocco Torrez, 18 anos. O cara que respondeu as perguntas abaixo passou em 3 vestibulares de Medicina. Todos em instituições públicas. Na minha opinião, um dos melhores estudantes brasileiros no ano. A proeza dele é digna de elogios. Ele passou na FAMEMA, que fica em Marília (SP) e é estadual. Foi aprovado na Medicina da UFRGS, que todos nós conhecemos bem e dispensa apresentações. Mas, no meu ponto de vista, o grande feito dele foi ter sido aprovado na Medicina da UFCSPA. Ele concorreu com os melhores estudantes brasileiros. Uma prova longa, cansativa. Que exigiu muito dos alunos. Além disso, disputou a vaga sem ter noção nenhuma do que era bom ou ruim. Ninguém tinha idéia de como seria a nota de acesso. Eu tomei a liberdade de considerar o ENEM o vestibular mais difícil da história. Ou seja, os 88 melhores estudantes brasileiros colocaram o nome ali. Sonho de todos. Poucos conseguiram. Espero que gostem. 

DG - Apresente-se...
V -Me chamo Vítor Rocco Torrez,  tenho 18 anos e, atualmente, moro em Porto Alegre.

DG - Fez vestibular para ????
V- Medicina

1)     DG -  Quais motivos te fizeram escolher esse curso?
V - Não sei muito bem... Eu sempre dizia que faria alguma engenharia, mas desde o início do 3º ano eu não consegui mais me ver em outro curso que não a medicina. Não consegui me enxergar o resto da vida construindo chips ou fazendo cálculos, apesar de adorar a matemática. Notei que o que me interessava mesmo eram as descobertas na área da saúde, e decidi seguir para esse lado.

1)      DG - Estudou aonde no ensino médio?
V - Estudei no colégio Leonardo da Vinci – Alfa, em Porto Alegre.

DG -  Levou a sério o ensino médio?
V - Levei, mas nunca fui muito de estudar. Provavelmente por isso não tenha passado na primeira tentativa...  =D

DG - Como foi a preparação para o vestibular?  
V - No início do ano, prestava atenção nas aulas e participava de todas as aulas extras, mas não estudava em casa. A partir de junho, mais ou menos, passei a me dedicar mais. Chegando em casa, sempre fazia os exercícios das matérias daquele dia. Não tinha tempo para fazer todos, então selecionava os principais. Porém, nunca deixei de lado o lazer. Todos os dias achava um tempo para os amigos e, pelo menos uma vez por semana, praticava algum esporte pela manhã. Acho que isso foi fundamental pra não chegar exausto no fim do ano. Outra coisa que achei de fundamental importância para o sucesso nas provas, foi nunca ter faltado nos simulados realizados pelo cursinho. Quase todos os fins de semana, tínhamos provas de dificuldade até maior do que a do próprio vestibular, o que me deixou realmente tranqüilo quando era pra valer, com o pensamento de “é apenas mais um simulado...” tão repetido pelos professores.

DG - Quanto tempo tu levou para passar?
V - Um ano. Fiz o vestibular quando acabei o colégio e não passei. Em 2009, fiz cursinho e os resultados estão vindo.

DG - Como era o teu dia a dia?
V -  De manhã, fazia os exercícios que não havia terminado na noite anterior e, algumas vezes, praticava algum esporte. Durante a tarde, ia para a aula e, ao chegar em casa, de noite, passava um tempo falando com a namorada e com amigos e começava a resolver os exercícios dos conteúdos passados naquele dia. Nos fins de semana, revia algo que restava de dúvida das aulas da semana e usava a maior parte do tempo para lazer.

DG - Fez muitas mudanças na tua rotina de estudo?
V - Sim... Após o fracasso no vestibular de 2009, vi que nunca havia estudado pra valer. Resolvi levar os estudos mais a sério durante esse ano.

DG - O componente emocional te ajudou na hora da prova? O que tu fez para aliviar a ansiedade no dia das provas?
V - Sim, acho que foi aí que ganhei uma verdadeira vantagem sobre alguns concorrentes. Cheguei em todas as provas realmente calmo, e dou o crédito por isso a duas coisas: o acompanhamento com o Daniel e os simulados que fiz. Os simulados serviram para me dar confiança e para me acostumar à rotina de provas. Por terem maior nível de dificuldade, ao chegar no vestibular, me sentia seguro ao iniciar as resoluções. Quando eu cansava ou passava por algum problema que influenciava no ritmo dos estudos, ia falar com o Daniel. As conversas com ele sempre ajudavam a me tranqüilizar e a voltar o foco aos meus objetivos iniciais.

DG - O que tu considera decisivo para alcançar o sucesso? Tu passou, até agora, em três instituições públicas, sonho de todo brasileiro.
V - Foco, disciplina, acreditar em si mesmo e calma.

DG - Qual o teu conselho para quem quer passar num vestibular concorrido, como são as públicas... 
V - Acho que o mais importante para os estudos é prestar atenção de verdade nas aulas. Fazendo isso, ao chegar em casa, um ou outro exercícios já bastarão pra revisar aquele conteúdo aprendido, ao invés de ter que reestudá-lo. Eu aconselharia a pessoa a destinar o ano para os estudos, mas sem deixar de reservar algum tempo diário para distrair a cabeça com outras coisas.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Parecia inofensivo...

Umas das maiores aflições da humanidade é saber o que é certo ou errado. A diferença entre o bem e o mal. O que é certo para um, não é para outro. A partir daí, surgem questões envolvendo ética, moral e valores. Entram assuntos como política, artes, religião, time de futebol e o que você mais puder e quiser imaginar. Em maio de 2009, acompanhamos uma dessas intermináveis discussões. E ela envolvia a educação brasileira. O MEC, percebendo que as coisas não estavam bem na educação do nosso querido país, resolveu mexer nesse negócio. 

Certamente, devem ter participado importantes entendidos em educação  para a elaboração desse novo modelo. O problema era o ensino superior. E, mais do que isso, o sistema de acesso. Era hora de mexer no vestibular.

Na época, quando li as regras do novo ENEM, comentei com todos: por esse novo método haverá uma elitização ainda maior no sistema de seleção ao ensino superior. Com as novas regras criadas, era perceptível que as coisas iriam dificultar ainda mais. E foi o que aconteceu.

O novo ENEM criou um monstro bem feio. Algo como os Backyardigans. Faz um tempo que observo filmes infantis com o meu filho. Existe alguém que não conhece os Backyardigans? Todo mundo conhece! Eu, por exemplo, já assisti todos os episódios. Voltando ao que interessa. Dentre os personagens dos Backyardigans está um pinguim amarelo e azul que fala! Putz, ia me esquecendo, ele também é surfista! Ou seja, um bicho meio estranho. Ninguém nunca viu um pinguim amarelo e azul. Mas que fala, eu já! Isso é uma outra história que vou contar num futuro distante. As crianças gostam, a inocência gera um desconhecimento do perigo. O ENEM gerou isso. Quem não prestou atenção nas novas regras, se deu mal. O bicho criado ia atacar um outro "bixo". Sim, o bicho ENEM ataca o "bixo" vestibulando.

De acordo com a nova regra, o vestibular passava a ser NACIONAL. Você fazia a prova em "Pipoquinha" do Norte (que o pessoal de "Pipoquinha" do Sul não se irrite pelo esquecimento!) e concorreria a uma vaga em qualquer uma das Universidades que haviam aderido ao novo ENEM. Estava criado um sistema de disputa "ultraconcorrido". 

Não estou defendendo a regionalização do ensino. Mas, num país de dimensões continentais, na minha opinião, isso não é viável. O novo ENEM esquece as características de cada região. As questões não cobrarão NUNCA, conforme foi dito no edital, questões  de conteúdo regional. Sul e norte, leste e oeste. Nada disso interessa mais. 

Com milhões de candidatos espalhados por todo o país, era evidente que a disputa seria acirrada. E numa disputa assim, leva vantagem quem está melhor preparado. Tenho certeza, após a realização da prova, que não é somente a questão geográfica que define vantagem. Li diversos comentários sobre a vantagem que São Paulo levou nesse novo sistema de disputa. E ,se São Paulo levou vantagem, é por um único motivo: alunos bem preparados! E como são muitos alunos, pior para todos.

O problema está na forma como se constrói um aluno bem preparado. Um vestibulando de elite se constrói com um bom aporte financeiro. Sim, com dinheiro. Diante disso, percebo dificuldades. Os grandes centros tem as melhores escolas, os melhores professores e , conseqüentemente, terão os melhores alunos. Como encontramos de sobra essa matéria-prima em São Paulo, o resultado mostrou isso. E foi justo! Sei que muitos não concordarão com o que digo, mas o ENEM selecionou os melhores estudantes brasileiros. Colocar o seu nome no listão do SiSU foi uma tarefa Hercúlea! Davi contra Golias! Falando da minha cidade e do meu estado, os listões da UFPEL e da UFCSPA, para Medicina, foram formados por verdadeiros heróis. Estudantes com um nível intelectual acima da média, com um capacidade cognitiva exemplar. Responder 180 questões e uma redação em, aproximadamente, 10 horas é tarefa pra lá de difícil. Exige conhecimento, estudo, capacidade de raciocínio, treinamento e controle emocional. Para se ter tudo isso só com muito investimento. Ou seja, privilégio de poucos no nosso país.

Passaram no novo ENEM os estudantes que tiveram os melhores professores, os melhores colégios. Tudo do bom e do melhor. Só que isso custa caro. Preparar-se para esse desafio exige tudo isso e mais um pouco. O estudante deve dedicar-se integralmente. Ele estuda, estuda e estuda. Entretanto, muitos desses estudantes tem que trabalhar. Penso que aí começam as injustiças. Apenas uma pequena parcela tem condições de se dedicar integralmente e tem condições financeiras de arcar com todos esses custos. Faça você mesmo uma pesquisa e tente descobrir quanto custa a preparação mensal de um vestibulando. Estamos falando de valores médios de 1000 reais. Eu falei média! Quantas famílias brasileiras tem condições de custear o ensino de seus filhos? Pouquíssimas. 

O MEC deveria era investir em escolas, remunerar melhor os professores, estimular a criação de cursos técnicos pelo país. Mas, não. Atacou o vestibular, sem dó nem piedade. Ops, será que atacou mesmo? Não! Ele turbinou o vestibular. O novo vestibular é ainda mais elitista que o antigo. Sai na frente quem tem o melhor ensino. E ele está no sistema privado. Portanto, custa caro. Sei que amanhã vou receber uma carta da comunidade "sou pobre e passei", mas essa carta será a exceção. Como toda regra... 

A pesquisa mostrou que 80% dos alunos não gostou do SiSU. Não foi surpresa. O que me interessa está atrás dessa informação. O que cada voto quis dizer. Percebi  que realmente as pessoas não simpatizaram com esse método. Muitas se sentiram injustiçadas pelo critério. Só que não foi ele o culpado. O sistema criado é justo. Os melhores do país foram aprovados. O injusto é a forma de se tornar um dos melhores. Agora é um outro papo. Esse é mais profundo. O Lula que resolva!